Mais do que um craque, Sócrates foi um herói do futebol brasileiro |
Minhas primeiras lembranças vivas
do futebol remontam ao final dos anos 70 e início dos anos 80 e estão
intimamente ligadas a quatro sujeitos: Renato, Sócrates, Zico e Maradona.
Renato foi o primeiro e
maior craque tricolor do qual me lembro. O modo como jogou e brigou durante a final
da Libertadores de 83 e os dois gols marcados no mundial do mesmo ano, elevaram
Renato a condição ídolo máximo de minha infância. Naquela época, eu queria ser
Renato.
Mas foi em 82 que senti - pela
primeira vez - como a paixão pelo futebol pode mexer com a vida da gente. A
Seleção Brasileira comandada por Telê Santana foi a primeira pela qual,
realmente, torci e foi a única por qual chorei. E entre a constelação de
craques que desfilava nos gramados da Itália com a camisa canarinho um, em
especial, era meu favorito: Doutor Sócrates.
A maioria de meus amigos era
“devoto” do Galinho de Quintino, mas por influência de meu pai corintiano, o
doutor era meu ídolo maior naquela seleção. Por ele comprava a cada três meses
o Kichute do Sócrates (com reforço duplo no calcanhar) e fazia questão de
sentar na frente da televisão a cada jogo do Corínthians.
Naquela época meu pai falava
de abertura política, da democracia corintiana, de anistia e da necessidade dos generais
serem apeados do poder, mas para mim o que importava de verdade eram os passes
magistrais e os golaços do “Doutor”.
Lamentei quando Sócrates
trocou o Corínthians pela Fiorentina e nunca aceitei vê-lo com a camisa do
Flamengo ou do Santos. Para mim, Sócrates era corintiano, mais do que isso, era
o próprio Corinthians, tal qual Renato era a própria personificação do Grêmio,
apesar de ter vestido várias outras camisas.
Com o passar dos anos passei
a acompanhar o “outro” Sócrates, o cara contestador, cheio de ideias
revolucionárias, de sangue socialista e, acima de tudo, um cara que via o
Brasil e o futebol muito além das quatro linhas. Isso só reforçou minha
admiração juvenil pelo craque da bola, que se transformou em craque do pensar.
É uma pena, que nos
noticiários sobre sua morte dêem mais importância a questão do alcoolismo do
que às suas ideias e opiniões sobre nosso país e nosso esporte favorito. É
muito medíocre falar apenas desse tipo de coisa quando se perde um patrimônio
vivo como Sócrates. Mas, infelizmente, mediocridade é a palavra chave da
imprensa brasileira do século XXI.
Em tudo isso fica a saudade
de um cara que se foi cedo demais e que, com toda a certeza, deixou seu nome
marcado na vida de muita gente.
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